A economia hoje é globalizada — na prática, isso significa que as transações comerciais deixaram de ser apenas locais para acontecerem também em escala internacional, abrindo uma gama de possibilidades muito maior, principalmente para as grandes empresas. É nesse cenário que se destaca o preço de transferência ou, no nome original em inglês, transfer pricing.
O que é o preço de transferência?
O transfer pricing é o controle que os organismos federais impõem às operações comerciais ou financeiras de empresas sediadas no Brasil com outras sediadas no exterior, desde que elas tenham alguma ligação.
Ele será aplicado sempre que uma empresa que está em um país realizar operações com outra, ligada a ela, que está no exterior. Ou seja, aplica-se às transações entre partes sediadas em diferentes jurisdições tributárias.
Seu objetivo é garantir que os impostos sejam pagos em todos os países pelos preços que seriam pagos por empresas não ligadas. Em outras palavras, a legislação brasileira sobre o preço de transferência visa garantir que o Brasil receba corretamente sobre as transações internacionais, e que o lucro explorado aqui não seja levado para o exterior.
Para entender um pouco mais sobre o que é o preço de transferência, como ele funciona e qual a sua importância, trouxemos uma entrevista com Marcelo Castro, gerente financeiro na ACG Worldwide, professor universitário na Unipaulistana e com mais de 26 anos de experiência na área contábil em multinacionais.
Além disso, Castro também é professor na Cursos Módulos dos cursos de Preço de Transferência, Normas Internacionais de Contabilidade, entre outros. Confira!
Como funciona o transfer pricing?
Marcelo Castro — "Para facilitar, vamos imaginar a seguinte situação: eu quero enviar dinheiro para minha matriz. Se eu remetesse dinheiro via royalties, teria que pagar imposto de renda. Se eu decidisse enviar dinheiro para minha matriz como dividendo, eu também teria um imposto de renda a ser pago.
Então, talvez, uma forma criativa de solucionar o problema seja eu comprar uma escada da minha matriz. Essa escada, na verdade, tem um custo de 100 dólares, mas eu compraria o produto por 150 dólares.
Quando eu pagasse a minha matriz eu estaria mandando 50 dólares a mais disfarçados em uma compra de produto, evitando o pagamento de impostos. Para evitar essa remessa de valor disfarçado de compra de mercado, é necessário fazer esse cálculo de preço por transferência”.
E quais os principais métodos utilizados para calcular o preço de transferência?
Marcelo Castro — “Temos quatro formas de fazer esse cálculo. A primeira delas se chama PIC (Preços Independentes Comparados), a segunda é o CPL (Custo de Produção mais Lucro de 20%), a terceira é o PRL (Preço de Revenda menos Lucro) e a quarta é o PCI (Preço sobre Cotação de Importação).
Na importação, cada uma dessas formas de cálculo tem suas vantagens e desvantagens. O PIC, por exemplo, é média aritmética ponderada de preços de bens e serviços apurados no mercado brasileiro.
Depois, o preço que eu tenho aqui no mercado brasileiro é comparado com outros países. Eu consigo fazer essa comparação e provar para o fisco que estou tendo o lucro dentro da margem que ele pede.
O grande problema do PIC é a dificuldade em toda a documentação exigida por lei. O método mais aplicado no Brasil é o PRL, porque ele exige basicamente a documentação de importação e a nota fiscal de venda”.
Quais são os erros mais comuns na hora de fazer os cálculos?
Marcelo Castro — “O preço de transferência é uma média de tudo que você importou nos meses do ano. É preciso ter em mãos a documentação de tudo que você importa com as empresas que são coligadas ou controladas por você. O primeiro erro é deixar para fazer tudo em dezembro, porque você não terá tempo para reunir e estudar tudo o que é necessário.
O segundo erro clássico é não calcular em dezembro. Tem-se a ideia errada de que só é preciso enviar essas informações para o fisco em junho, quando é o momento de fazer a ECF (Escrituração Contábil Fiscal).
Se você tiver ajustes a serem feitos para o Imposto de renda, vai precisar do cálculo em dezembro. Caso contrário, terá que recalcular o imposto, pagar os 20% de multa e todas as correções monetárias. O valor pode assustar".
São erros sutis, mas que podem ter consequências graves:
- não ter a documentação correta em mãos;
- escolher a forma errada de fazer o cálculo;
- deixar para a última hora.
Qual a importância do preço de transferência para o planejamento orçamentário?
Marcelo Castro — “O planejamento orçamentário deve ser baseado em dados e pesquisas, certo? Então, o cálculo do preço de transferência é um desses dados. Ele evita que a empresa pague valores mais altos ou mais baixos que o correto, o que afetaria negativamente seus resultados.
Além disso, a transparência é uma das regras da governança corporativa, e o transfer pricing é justamente uma forma de buscar e demonstrar essa transparência. Mostra que a empresa não sonega e que trabalha de forma ética”.
Mais alguma dica importante?
Manter a documentação em dia
“Eu uso uma planilha que é alimentada todo fim de mês com as informações necessárias: DI, nota fiscal e invoice. Quando o fiscal vem pedir a documentação, eu já tenho tudo pronto”.
Não ter medo da fiscalização
“Os contribuintes, em geral, têm muito medo da fiscalização. Pode ser um tiro grande no pé. Se você não entregar a documentação, o fiscal pode arbitrar o cálculo. Uma vez feito isso, você fica sem condições de argumentar com ele. Ou seja, você vai aceitar o valor que ele passar e isso vai sair muito mais caro”.
Dar a devida importância ao preço de transferência
“Muita gente não acredita em fiscalização de preço de transferência, porque acha que isso não será fiscalizado. É preciso entender que preço de transferência tem uma área específica dentro da Receita Federal. Essa área é extremamente especializada dentro do órgão. São pessoas que conhecem muito a legislação”.
Não omitir informações
“Na obrigação acessória, existem alguns pontos que devem ser preenchidos. Se alguém deixar em branco ou preencher ‘por cima’, sem dar os detalhes necessários, o fiscal pode interpretar como uma sonegação fiscal.
Se você informar seu preço de transferência com o valor errado, pode até conseguir passar. Mas deixar uma informação em branco sabendo que deveria ser preenchida é caso de sonegação, que tem 55% de multa, mais ações penais”.
E aí, gostou das dicas? Quer saber mais detalhes sobre o preço de transferência ou outros assuntos da área contábil? A Curso Módulos oferece diversos cursos e treinamentos de qualidade, com orientações técnicas e legais para os profissionais da área. Entre em contato conosco e tire todas as suas dúvidas!